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Wednesday, August 25, 2010

Uma Última Homenagem


In Jornal Impacto da Região

Soube há pouco que perdi um aluno. Não o perdi por abandono do curso, não o perdi por ele ter arranjado trabalho ou se ter cansado, como é habitual. Perdi-o eu, a sua família e o Mundo. Perdi-o porque se rendeu, porque desistiu, porque a única saída que viu foi acabar com a vida. Em cada linha que escrevo visualizo-lhe o rosto, escondido e silencioso na última fila da sala. Em cada minuto que passa relembro o e-mail que lhe enviei quatro dias antes da sua morte perguntando se estava bem e se o poderia ajudar em alguma coisa. Não perdi apenas um aluno. Perdi aquele. Aquele ser único na sua especificidade. Porque nenhum ser humano é igual a outro. Porque cada aluno que tenho é insubstituível.

Gostava que ele tivesse desistido do curso para ir ao Boom Festival. Gostava que ele tivesse desaparecido por ter arranjado trabalho num país distante, por ter conhecido alguém e ter partido à aventura, por ter decidido que queria ser cozinheiro em vez de outro técnico. Gostava que ele tivesse pedido ajuda e, sobretudo, gostava de ter percebido antes que o calmo e silencioso aluno estava infeliz, estava deprimido e a bater no mais fundo do fundo.

Hoje o dia é de pesar. É um dia para pensar a vida. Valorizar as pequenas coisas. É um dia para tentarmos compreender como numa turma com mais de vinte pessoas só sabemos da morte de um “dos nossos” um mês depois. Vivemos em rede mas cada um na sua ilha. Partilho estes pensamentos convosco porque são importantes para o meu crescimento e espero que para o vosso. Na morte do outro percebemos melhor a nossa vidas.



Tatiana Santos

Psicóloga Clínica, doutoranda em Psicanálise

Espaços em Palmela * Lisboa * Alverca

http://cronicasdeumamentesa.blogspot.com

3 comments:

  1. Inflizmente é tarde quando nos apercebemos que perdemos alguém e esse alguem é nosso colega.
    Prova que somos egoistas, pois passamos o tempo a olhar para nós e a lamentarmo-nos quando deviamos prestar mais atenção a quem está ao nosso lado.
    Gostei muito do texto que escreveu.

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  2. Obrigado pele atenção, a esposa e os filhos do João . Ana, João e Paulo

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  3. Fui colega de trabalho do João Paulo até há alguns anos atrás... até ele perder o emprego estável que tinha (não importam agora os motivos dessa perda), iniciando-se então o princípio do fim, de um fim trágico que ninguém imagina que um dia pode deixar de ser um pensamento para passar a ser real. Na pequenez da nossa condição humana, nem sempre conseguimos ajudar, nem sempre estamos à altura...
    Nunca fomos íntimos, nem fomos amigos, fomos apenas colegas. Chegámos a partilhar pequenas coisas: gostos musicais e culturais; troca de opiniões sobre diversos assuntos; o brilho nos nossos olhos e a felicidade nos nossos rostos quando comentávamos, um com o outro, as façanhas e os progressos dos nossos filhos (o meu filho e um dos filhos do João Paulo são pela mesma idade). Afinal ainda partilhámos grandes coisas...
    Os meus filhos ainda me têm. A Ana, o João, e o Paulo vão ter em mim sempre um amigo.

    Do João Paulo apenas vou recordar os pequenos e raros momentos em que convivemos alegremente.

    Felicito-a pelo seu trabalho, pelo seu blog, por este texto, por esta homenagem, pela sua sensibilidade e pelos seus valores humanitários.

    Bem Haja.

    Arnaldo Abreu

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